A comunicação de liderança em uma era de aparências

Vivemos uma era de aparências. Precisamos parecer bonitos, saudáveis, competentes, pessoas de sucesso. Não basta ser tudo isso, é preciso parecer. Em um mundo com tantos filtros mascarando nossos defeitos, fica mais árduo dar o passo inicial e indispensável para o nosso desenvolvimento: o passo do autoconhecimento, que requer ter consciência e assumir as próprias lacunas.

Líderes sofrem pressão ainda maior nesse cenário porque precisam, mais do que qualquer outra pessoa, aparentar sucesso e competência. Para eles, pode parecer ainda mais difícil, ou até arriscado, assumir defeitos. O autoconhecimento acaba sendo visto como um passo em falso, algo a evitar.

O problema é que a consciência sobre as próprias lacunas é base para o desenvolvimento humano e não é diferente na comunicação.

A autoconsciência é sempre a primeira etapa nos meus trabalhos voltados ao desenvolvimento de líderes. Nesse processo, a liderança recebe devolutivas a respeito de seu nível comunicacional. As reações são as mais diversas, daria para escrever um livro apenas sobre elas. Há líderes que lidam bem com as próprias lacunas, se sentem desafiados a melhorar ou até se emocionam na jornada da autoconsciência, mas há também aqueles que se mostram inicialmente mais resistentes, questionadores ou irritados.

Com o passar dos anos, enquanto tratava as lacunas desses líderes em comunicação, fui notando e trabalhando uma lacuna em mim. Faltava mais empatia da minha parte. Antes da consultoria, atuei por uma década em algumas empresas e, como comunicadora, buscava e incentivava a relação de parceria dos líderes com nossa área, nem sempre com sucesso. Muitas vezes era frustrante esperar da liderança um comprometimento que não surgia. Migrei para a consultoria carregando esse histórico, o que me tornou pouco empática.

Endureci diante da dificuldade de alguns líderes em lidar com suas próprias falhas até que finalmente percebi que esse era um processo muito doloroso e difícil para quem tanto precisa aparentar perfeição..

Hoje, além da empatia que preciso ter para de fato ajudar esses líderes a se desenvolverem, procuro oferecer também um alerta aos colega comunicadores que, exaustos da rotina pesada e de incontáveis tentativas frustradas, também se tornaram resistentes e pouco empáticos com as lacunas e dificuldades da liderança.

Digo isso porque, tanto nas atividades da consultoria quanto de pesquisa acadêmica e conversas com colegas, noto um número perigoso de comunicadores mal posicionados nas organizações. Eles estão aplicando treinamentos prontos que tratam o desenvolvimento humano como receita de bolo, esperando da liderança comprometimento e consciência a respeito de seu papel comunicador sem apontar um caminho para isso ou sobrecarregando os líderes com informações na expectativa de que eles atuem como canais de comunicação. Muitos desses comunicadores estão lidando com a frustração e a vontade de desistir diante da resistência ou apatia da liderança.

Mas onde nós, comunicadores, deveríamos estar posicionados, então?

Em primeiro lugar, compreendendo que líderes não são canais, são seres humanos sobre os quais não temos controle, mas que podemos e devemos capacitar, desenvolver e ter como parceiros. Essa é, aliás, uma parte de nossa atuação que é estratégica e humana ao mesmo tempo, pois gera resultados enquanto desenvolve pessoas. Que tarefa mais cheia de complexidade, responsabilidade e beleza!

Em segundo lugar, deveríamos estar ao lado dos líderes nessa jornada do autoconhecimento, oferecendo a eles ferramentas e apontando o caminho com empatia e paciência. É importante que eles formem opinião sobre suas próprias habilidades, de forma a desenvolver um olhar crítico, mas que conheçam também a perspectiva de seus pares, seus liderados e de nós comunicadores que, afinal, somos especialistas no campo.

Em terceiro, deveríamos estar em posição de lembrar que a comunicação não é um processo simples, muito menos uma receita de bolo. Pessoas apresentam diferentes níveis e habilidades comunicacionais, bem como distintas lacunas e dificuldades, tudo isso precisa ser levado em consideração se de fato queremos o desenvolvimento humano como resultado. Capacitações e treinamentos só desenvolvem pessoas se são construídas com base nas necessidades dessas pessoas.

É importante que a gente reflita sobre nosso posicionamento como comunicadores para que estejamos certos de que estamos oferecendo parceria aos líderes enquanto buscamos parceria.

Onde você, comunicador, está posicionado na jornada da liderança em comunicação?

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